A Comissão de Direitos Humanos e Cidadania (CDHC) da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece) realizou, nesta quinta-feira (05/12), audiência pública para promover o lançamento do Observatório Justiça e Democracia, criado pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD).
A reunião, que foi requerida pelo presidente da CDHC, deputado Renato Roseno (Psol), teve como tema “Impunidade e violência no campo”, com destaque para o caso de José Maria do Tomé, agricultor e líder comunitário assassinado em 2010 na região da Chapada do Apodi, no Vale do Jaguaribe, em decorrência de sua luta contra a pulverização aérea de agrotóxicos e pela distribuição de terras entre os pequenos agricultores.
O parlamentar destacou a importância da luta para garantir o estado democrático de direito e citou a recente descoberta de um plano de golpe para evitar a posse do então presidente eleito Luis Inácio Lula da Silva.
Renato Roseno lembrou ainda que essa luta pela preservação da democracia se faz em âmbito local e também no campo, e citou o caso do assassinato de José Maria do Tomé, que teve, neste ano, o júri de um dos acusados, que foi condenado pelo envolvimento nesse crime.
O deputado informou ainda que o Prêmio Frei Tito de Alencar, concedido pela Alece a pessoas e entidades dedicadas à defesa e efetivação dos direitos humanos, será concedido in memoriam a José Maria do Tomé, no próximo dia 9 de dezembro, na Alece. Renato também se colocou à disposição para colaborar com o envio de uma denúncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre o caso de José Maria do Tomé.
A coordenadora do Observatório Justiça e Democracia, advogada Ecila Meneses, contextualizou a criação do Observatório Justiça e Democracia, idealizado em 2016. Ela aponta a existência de violações protagonizadas pelos próprios atores do sistema de Justiça, durante os processos contra a então presidente Dilma Rousseff; além de denúncias de irregularidades no processo da Lava Jato, entre outros casos. “Vários juristas do Brasil inteiro se sentiram chamados para uma luta organizada, de uma forma mais sistemática”, comentou.
A advogada ressaltou ainda que o sistema de Justiça foi, nesses últimos anos, protagonista de uma série de desrespeitos e violações a princípios constitucionais fundamentais e, por isso, surgiu a necessidade de criar a entidade. “O observatório é mais uma atividade da ABJD que tem a intenção de gerar uma comunicação mais ágil com as entidades e com a sociedade e também serve para gerar um mapeamento”, informou.
A coordenadora do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador e Saúde Ambiental (Ceresta), Márcia Xavier, é filha do ativista José Maria do Tomé e detalhou sua luta por justiça. Ela ressaltou que, somente após 14 anos do crime, um dos intermediários do assassinato foi levado a julgamento e que apenas ele foi condenado.
Márcia Xavier lembrou ainda diversas violência institucionais sofridas durante as apuração do assassinato, quando ela e seus familiares eram ouvidos em depoimentos cheios de pressão, além de recusa do acesso a informações e a documentos da investigação, da demora de dois anos na realização do exame balístico e de julgamentos marcados e desmarcados várias vezes. "Ainda não chegou ao fim. O nosso objetivo é que o mandante seja condenado. Apenas uma parte da justiça foi feita, porque só uma das pessoas envolvidas no assassinato foi punido”, concluiu.
Para o superintendente do Instituto do Desenvolvimento Agrário do Ceará (Idace), João Alfredo Telles Melo, a justiça nesse caso não será plenamente contemplada se os mandantes não forem punidos. “Como é que você tem um crime de encomenda, um crime de aluguel, um crime político sem um mandante? Precisa ser apurado como foi apurado o caso da morte da [vereadora] Marielle Franco”, cobrou.
Para a advogada Geovana Patrício, não é correto que apenas um dos intermediários do assassinato seja responsabilizado e os beneficiados com a morte de José Maria do Tomé fiquem impunes. Ela defendeu a internacionalização do caso por meio de denúncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos. “A gente deseja que realmente haja a internacionalização desse crime para que a gente veja o reconhecimento da ligação entre o crime do Zé Maria, os mandantes e a razão por qual o Zé Maria foi assassinado, para que isso não se repita”, defendeu.
Também estiveram presentes na audiência a ouvidora geral externa da Defensoria Pública do Estado, Joyce Ramos; o representante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia - Ceará, Rodolfo Frank; a representante da Federação Nacional dos Estudantes de Direito, Yasmin dos Santos; e a representante ddo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, Margarida de Oliveira. Também acompanharam o debate os representantes da Comissão de Direitos Humanos da OAB-CE, da Superintendência do Ibama, do Escritório Frei Tito de Alencar, da Federação dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal do Estado do Ceará, Cdo entro de Assessoria Jurídica Universitária da Universidade Federal do Ceará (UFC) e do Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal no Estado do Ceará. (Texto: Juliana Melo – Agência ALECE / Foto: Máximo Moura – Agência ALECE)
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