Audiência propõe busca ativa e assistência a crianças e adolescentes órfãos da Covid

06/10/21 11:08

A situação de crianças e adolescentes que ficaram órfãos em decorrência da Covid-19 no Ceará, bem como as políticas de assistência social e financeira foram debatidas, nesta terça-feira (05/10), em audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos e Cidadania (CDHC) da Assembleia Legislativa. A reunião virtual atendeu solicitação do deputado Renato Roseno (Psol), com subscrição do deputado Guilherme Sampaio (PT).

O presidente da CDHC, Renato Roseno, apontou a importância de evitar uma “superinstitucionalização” desses adolescentes e crianças que perderam pai, mãe ou responsáveis para a Covid-19. Segundo o deputado, esse é um dos maiores desafios deixados pela pandemia, pois estima-se que, somente no Brasil, mais de 190 mil jovens perderam os pais para a doença. No Nordeste, chega a aproximadamente 20 mil e, no Ceará, cerca de 6 mil órfãos da Covid.

“Nós estamos aqui hoje para falar desse tema, colocá-lo na sociedade, nas instâncias públicas, formular políticas públicas e desenvolver os melhores esforços para a implementação dessa política. Queremos nos somar a essa corrente nacional. E, se não tiver uma pressão social, não conseguiremos esse suporte aos jovens”, pontuou Renato Roseno.

Dentre os encaminhamentos tirados na audiência estão busca ativa para localizar e identificar crianças e adolescentes que perderam pai e/ou mãe e/ou responsáveis; formação de um plano estratégico e operacional que envolva as seguranças alimentar, psicossocial e o direito ao convívio familiar; criação de um programa de transferência de renda dentro da estrutura do Sistema Único de Assistência Social (Suas); previsão orçamentária de médio e longo prazo para implementação dessas politicas. Além disso, ficou definido que as entidades e órgãos públicos participantes da audiência formarão uma comissão para elaborar e acompanhar o andamento do plano.

O deputado Guilherme Sampaio afirmou que a orfandade da pandemia é ocasionada por mortes que poderiam ter sido evitadas, se não fosse uma negligência do Estado brasileiro. De acordo com o parlamentar, a falta de ações de combate à pandemia e o negacionismo levaram o Brasil a ter “uma geração de órfãos”. “Centenas de milhares de pessoas ficaram sem um pai, sem uma mãe, devido a uma doença terrível. Essa mortandade que poderia ter sido evitada. Os estados têm um papel fundamental neste momento em que é preciso dar suporte assistencial. É preciso transformar essa dor em potência”, disse.

Guilherme Sampaio destacou ainda que está em tramitação na Assembleia Legislativa o projeto indicação 357/21, de sua autoria, intitulado de Ceará Cuida. O programa sugere auxílio financeiro às crianças e adolescentes cujo pai e/ou mãe ou responsável familiar tenha falecido em decorrência da Covid-19.

A covereadora de Fortaleza Louise Santana (Psol), da mandata coletiva Nossa Cara, disse que há uma importante mobilização nacional para tratar de vacinas, do acesso à saúde, do combate à fome, mas também há a necessidade de tratar desse tema sensível: “a orfandade da pandemia”.

Segundo a parlamentar apontou, o Consórcio Nordeste sugeriu a implantação de um auxílio para essas crianças e adolescentes órfãos, intitulado de Nordeste Acolhe, no valor de R$ 500. No entanto, apenas o estado do Maranhão está pagando o auxílio, e a Paraíba já teve o projeto aprovado. A vereadora sugeriu ainda que o Ceará institua essa política e também auxilie esses órfãos. “Importante lembrar que o apoio a essas crianças e adolescentes não deve ser apenas financeiro. Há uma necessidade maior, de apoio social, psicossocial, e dar suporte para o desenvolvimento pessoal”, disse.

A professora Ângela Pinheiro, do Núcleo Cearense de Estudos e Pesquisa sobre a Criança (Nucepec) da Universidade Federal do Ceará (UFC), ressaltou a importância de ações e políticas públicas para dar visibilidade e amparo aos órfãos da Covid-19. Conforme a professora, crianças e adolescentes já perderam pai, mãe ou responsáveis há mais de um ano e meio, o que reafirma a urgência para a criação de estratégias para dar o suporte aos desamparados.

“Essas políticas públicas precisam ser de proteção e cuidado. É necessário apoio financeiro, apoio psicossocial e providências do Sistema de Justiça. Somos defensores também do fortalecimento dos serviços já existentes, com a ampliação de equipamentos e equipes. Precisamos seguir com diálogo e de mãos dadas para alcançarmos esses benefícios”, pontuou Ângela Pinheiro.

A representante do Fórum Permanente das ONGs de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ceará (DCA), Bibi Mesquita, alertou para o não cumprimento da execução orçamentária para a assistência à criança e ao adolescente. Segundo apresentou, de 2012 a 2020, deixaram de ser executados mais de R$ 241 milhões em recursos destinados ao Pacto pelo Fortalecimento das Políticas de Assistência Social, por parte do Governo do Ceará. Já em Fortaleza houve, de acordo com ela, uma redução significativa do valor assegurado pelo Plano Plurianual (PPA) de R$ 25 milhões, se comparado o período vigente, que se encerra este ano, com o que está proposto para o próximo, que vai de 2022 a 2025.

A deputada federal Fernanda Melchionna (Psol-RS) acentuou que a pandemia no Brasil foi potencializada, não somente pela dimensão da pandemia, mas também pelo “negacionismo e obscurantismo” do Governo Federal, e poderia ter sido pior, se não fossem os esforços dos profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS). “O Brasil vai enfrentar um trauma social profundo, pois 600 mil mortos não é apenas um número, são pessoas, são famílias. Quando falamos dos direitos da criança e do adolescente, imaginar que 190 mil deles ficaram órfãos na pandemia e não ter nenhuma política pública pronta para execução. Bastava uma: incluí-las em um programa de transferência de renda. Esses órfãos do Covid precisam ter um cuidado especial”, afirmou.

O secretário executivo da Proteção Social da Secretaria de Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos do Ceará (SPS), Francisco Ibiapina, afirmou que, até o momento, não há o registro de nenhuma criança ou adolescente em abrigo, em Fortaleza, em decorrência da morte de pais ou responsáveis vítimas da Covid-19. Segundo ele, é importante fazer um levantamento mais detalhado para avaliar o quadro real do Estado e apontou a necessidade de fortalecer a busca ativa para conhecer com mais detalhe o cenário.

“A identificação é a chave de tudo. Esperamos concluir esse trabalho de cruzamento com os dados da vigilância da Secretaria de Saúde com o Cadastro Único (CadÚnico) para que tenhamos um diagnóstico fechado e possamos levar ao governador do Estado (Camilo Santana) a real situação e assim fazer de uma maneira bem alinhada com a realidade do Estado o encaminhamento com o que está previsto no Nordeste Acolhe”, garantiu.

Participaram da audiência pública representantes da Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico) Brasil; do Ministério Público do Ceará; dos conselhos regionais de Enfermagem e Fisioterapia; da Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza; do Coletivo Rebento; do Comitê Estadual de Políticas Públicas da População em Situação de Rua do Ceará; da Secretaria Municipal dos Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SDHDS) de Fortaleza; da Rede Desenvolvimento Local, Integrado e Sustentável do Grande Bom Jardim (GBJ)/Comitê Popular de Enfrentamento à Covid-19 no GBJ; do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (CEDCA) e outros.

Texto: ASCOM-AL

Áreas de atuação: Infância