O MEC de Bolsonaro: molecagem, delírios, incompetência e corrupção

22/06/22 16:00

A prisão do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, acusado de montar um esquema de cobrança de propinas com repasses irregulares do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, foi mais um capítulo na série de polêmicas, disputas e escândalos de corrupção e incompetência que vêm marcando o Ministério da Educação durante o (des)governo Bolsonaro. Em três anos e meio de gestão, já foram cinco ministros à frente da pasta – cada qual mais inapto e inepto que o outro.

Mais do que qualquer outro ministério, o MEC foi objeto de disputa entre a ala chamada “ideológica” dos apoiadores de Bolsonaro, muito ligada aos delírios e à fanfarronice de Olavo de Carvalho; a ala militar, dirigida pelos generais que orbitam em torno de Bolsonaro; e a ala dita “política”, ou fisiológica mesmo, que se move pautada pelo pragmatismo clientelista do Centrão. Tanto de um lado quanto de outro, os escândalos de corrupção não pararam de jorrar – interferência no ENEM, obras fantasmas, gabinete paralelo, superfaturamento, propinodutos etc.

O resultado dessa queda de braço foi um verdadeiro sucateamento da educação brasileira, tanto do ponto de vista das políticas (não) implementadas e do enfraquecimento das áreas técnicas da pasta quanto do ponto de vista da queda do financiamento. Desde 2019, apesar da arrecadação crescente da Receita Federal, o MEC teve queda na aplicação de recursos de pelo menos 13%. A gestão do MEC durante o (des)governo Bolsonaro é simplesmente a pior da história.

Abaixo, a relação dos ministros que se revezaram à frente do MEC desde 2019

Ricardo Velez – 01/01/2019 a 09/04/2019

Ungido pela boçalidade do “olavismo”, Velez ficou apenas quatro meses no cargo. Nascido em Bogotá (Colômbia) e naturalizado brasileiro em 1997, saiu na semana em que o governo completou seus cem primeiros dias – quando houve ao menos 14 demissões no alto escalão. Foi exonerado após seguidas “bolas divididas” com os militares.

Seu único legado foram meia dúzia de frases preconceituosas e desastradas, a exemplo da comparação entre brasileiros e “canibais”. "(Brasileiro) rouba coisas dos hotéis, rouba o assento salva-vidas do avião; ele acha que sai de casa e pode carregar tudo. Esse é o tipo de coisa que tem de ser revertido na escola", declarou. Também chegou a afirmar que a universidade não seria para todos, mas “apenas para algumas pessoas”.

Sua agenda se resumiu a enviar uma carta a todas as escolas do País pedindo que, no primeiro dia letivo, fosse lido o slogan de campanha de Bolsonaro, “Brasil acima de tudo. Deus acima de todos!” e que as crianças fossem filmadas cantando o Hino Nacional. A leitura do slogan foi apontada como inconstitucional e a gravação das crianças, sem autorização dos pais, contraria o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Oficialmente, foi demitido por “falta de experiência” para gerir a pasta.

Abraham Weintraub – 09/04/2019 a 19/06/2020

Com a saída de Velez, olavistas e militares tensionaram pela nomeação do sucessor. Venceram os olavistas e o posto foi ocupado pelo economista Abraham Weintraub, que promoveu uma grande “balbúrdia” no MEC (para usar uma expressão de sua predileção) ao longo de pouco mais de 14 meses: cortes no orçamento de universidades, controvérsias do Enem, intervenção na CAPES, tentativa de esvaziamento da UNE, frases polêmicas e teorias da conspiração. Quando virou alvo do inquérito das fake news no STF (Supremo Tribunal Federal), saiu do cargo.

Foi ele quem disse que as universidades públicas promoviam “balbúrdia” em seus campi – inclusive com “plantações extensivas de maconha”, molecagem que acabou gerando condenação para a União. Também promoveu cortes e congelamentos em diversas instituições de ensino superior, mesmo naquelas com ótimo desempenho em critérios técnicos de avaliação. O corte de 30% no orçamento discricionário se estendeu para todas as universidades federais, bem como o sucateamento deliberado dos investimentos em pesquisa.

Sempre com discurso agressivo e ideologizado, Weintraub tornou-se muito próximo a Bolsonaro e à militância mais fanática do governo. Mas, polemista de segunda categoria, que chegou a escrever “imprecionante” em uma postagem no twitter, também criou muitos problemas para o Planalto. A começar pelos comentários racistas contra a China e os chineses, o que acabou gerando um inquérito no STF a pedido da Procuradoria-Geral da República. E depois com o próprio STF, quando sugeriu que todos os ministros, “esses vagabundos”, fossem presos.

Foi seguidamente derrotado no Congresso e no STF, inclusive quando tentou mudar a forma de escolha de reitores das instituições federais, eliminando possibilidade de consulta paritária à comunidade acadêmica.

Carlos Alberto Decotelli – nomeado mas não assumiu

Com a saída de Weintraub, o indicado para o cargo foi Carlos Alberto Decotelli, que nem chegou a tomar posse por ter fraudado seu currículo profissional.

Milton Ribeiro – 16/07/2020 a 28/03/2022

Pastor presbiteriano e advogado, Milton Ribeiro foi o ministro bolsonarista que durou mais tempo às frente do MEC. Sua gestão foi marcada por declarações homofóbicas, elitistas e contra o ensino público. Em setembro de 2020, por exemplo, relacionou homossexualidade à desestruturação das famílias. "Acho que o adolescente, que muitas vezes, opta por andar no caminho do homossexualismo (sic), tem um contexto familiar muito próximo, basta fazer uma pesquisa. São famílias desajustadas, algumas. Falta atenção do pai, falta atenção da mãe", disse. A fala fez a Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciá-lo ao STF por crime de homofobia.

Em protesto contra sua gestão, no ano passado, 37 servidores do Inep, órgão responsável pelo Enem, entregaram seus cargos numa demissão em massa. Denunciavam "fragilidade técnica e administrativa da atual gestão máxima" do órgão, além de mencionaram episódios de assédio moral. O episódio ocorreu a menos de três semanas da aplicação do Enem.

Ribeiro foi exonerado após a revelação de uma gravação na qual ele afirma que repassava verbas do MEC para prefeituras indicadas por dois pastores, a pedido do presidente Jair Bolsonaro. O episódio ficou conhecido como “Bolsolão do MEC”, uma grande rede de tráfico de influência e propinas em que pastores evangélicos cobravam de prefeitos barras de ouro e contratos de compra de Bíblias em troca de facilitação no acesso às verbas federais.

Ribeiro foi preso nesta quarta-feira (22). Ele é um dos alvos de uma operação da Polícia Federal contra suspeitos de operar um balcão de negócios no Ministério da Educação e na liberação de verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Contra ele, pesam acusações de corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência.

Victor Godoy Veiga – desde 18/04/2022

Veiga é ungido pelo Centrão à frente do MEC e representa os interesses clientelistas do partido do PL, partido do presidente Bolsonaro, e de outras siglas como o PP. Em abril deste ano, diretores do Fundo Nacional de Educação indicados por Valdemar da Costa Neto (PL) e Ciro Nogueira (PP) autorizaram licitação bilionária para a compra de ônibus escolares com preços superfaturados. O ônibus que deveria custar até R$ 270 mil era comprado por mais de R$ 480 mil. Com isso, o valor global da licitação pulou de R$ 1,3 bilhões para mais de R$ 2 bilhões. A homologação do pregão foi suspensa por determinação do Tribunal de Contas da União.

Outro escândalo que marca a atual gestão do MEC é a destinação de R$ 26 milhões para compra de kits de robótica para escolas de pequenos municípios de Alagoas que sequer contam com água encanada e computadores. A empresa contratada para fornecer os “kits” pertence a um aliado de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados e grande patrono das “verbas de relator”, o chamado orçamento secreto. (Texto: Felipe Araújo)

Áreas de atuação: Educação, Política