Projeto de lei quer regulamentar uso de cannabis medicinal no Ceará

05/10/23 18:00

O mandato do deputado estadual Renato Roseno (Psol), em conjunto com outros cinco parlamentares, deu entrada nesta quinta-feira (05) com o projeto de lei (nº 1014/2023) que regulamenta o uso de cannabis medicinal no Ceará e possibilita a oferta de medicamentos à base de canabidiol pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Caso aprovado, a Política Estadual de Cannabis para fins terapêuticos ainda prevê o incentivo às associações, o fomento à pesquisa científica e a capacitação dos profissionais da rede pública e de entidades conveniadas à rede estadual de saúde.

A iniciativa, que também é assinada pelas deputadas Larissa Gaspar e Jô Farias, e pelos deputados De Assis Diniz, Guilherme Sampaio e Missias Dias, foi construída a partir da parceria com movimentos sociais, associações, médicos e advogados que defendem o uso terapêutico da cannabis. Um grupo de representantes de entidades das várias regiões do Ceará esteve na Assembleia Legislativa, nesta quinta-feira, para a entrega simbólica deste projeto.

Atualmente, 16 estados brasileiros já têm leis relativas à garantia de produtos à base de cannabis para uso medicinal pelo SUS. São eles: Acre, Alagoas, Amapá, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, São Paulo, Sergipe e Tocantins. “O Ceará muitas vezes se orgulha de certos pioneirismos. Ele não será pioneiro. Na verdade, ele está atrasado em relação a outros estados”, lembra Renato.

Os canabinoides não estão na lista do SUS, tampouco as associações de pacientes possuem expressa autorização legal para cultivar a cannabis, sendo obrigadas a recorrer ao Poder Judiciário mediante habeas corpus. No Ceará, 34 salvo-condutos já foram concedidos com esse objetivo. Na esfera administrativa, destaca-se que o Conselho Estadual de Saúde do Ceará aprovou resolução, em junho de 2022, que referenda minuta de projeto de lei que cria a Política estadual de saúde com a utilização da cannabis.

Na avaliação de Renato, a não utilização de terapias a partir da cannabis se dá por uma agenda reacionária que ainda é forte no país. “É uma agenda anticiência, que impede hoje, inclusive, o acesso às terapias que seriam muito baratas e que dariam uma qualidade de vida às várias pessoas que sofrem com patologias, desde as neurológicas ao tratamento de neoplasias com dores intensas”, explica o parlamentar.

“Eu tenho pessoas em minha família que são idosas em situação de patologias neurológicas e que fazem uso prescrito de canabinoides, mas têm acesso porque podem comprar um medicamento, que está na faixa de R$700. Se esse medicamento está disponível para um setor que pode pagar R$700, por que não poderia estar disponível na rede SUS? Isso é uma violação do direito!”, indigna-se Renato.

O que diz a lei?

A Política Estadual de Cannabis para fins terapêuticos engloba muitas demandas. Entre elas, estão o apoio técnico-institucional para pacientes, seus responsáveis e associações de pacientes, incentivar a pesquisa científica e os projetos de extensão em universidades públicas e privadas e pessoal para prescrição e acolhimento dos pacientes na rede estadual de saúde e a dispensação pelo SUS.

As associações, neste caso, são organizações da sociedade civil sem fins lucrativos que já acolhem e incentivam o acesso à informação e ao desenvolvimento de pesquisas, suporte técnico, jurídico ou terapêutico aos pacientes e seus familiares. No Ceará, estima-se que 17 entidades atuam neste trabalho. Caso se torne lei, estas instituições poderão realizar convênios e parcerias com entidades públicas ou privadas para a realização de padronização de seus produtos e controle de qualidade.

Uma delas é a Associação de Mães Escolhidas do Cariri (Ame), que recebe dezenas de pessoas e possui sedes em Crato e Juazeiro do Norte. Ela surgiu em 2016 para dar suporte às mães de bebês com microcefalia que nasceram em meio a epidemia de Zika Vírus. Atualmente, oferece apoio a cerca de 200 pacientes que necessitam fazer uso da maconha medicinal.

Texto alternativo

A presidente da AME Cariri, Arlet Almeida, acredita que a apresentação deste projeto de lei é uma grande conquista. “Estou muito emocionada por estar segurando este texto, que foi uma luta coletiva. É um momento histórico. A maconha nos uniu no propósito de levar qualidade de vida não só para os pacientes, mas para as famílias”, resumiu.

Mãe de Pedro Lucas, Arlet enfatiza a importância da cannabis medicinal para o tratamento do seu filho. “Estou nessa luta por ele. A maconha entrou na minha vida por causa dele, que tinha mais de 30 crises compulsivas diárias. Hoje, ele está vivo por causa da planta. A gente (da AME) conseguiu estender isso para outras mães que podem usufruir desse tratamento”, acrescenta.

Pesquisa

O projeto regula que instituições de pesquisa, órgão ou entidade, que consiguem uma autorização sanitária emitida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ou pelo Judiciário, que querem cultivar, fabricar, importar e comercializar produtos de cannabis para fins medicinais. As instituições de pesquisa poderão auxiliar atividades relacionadas ao cultivo, colheita e manipulação de sementes, mudas, insumos e derivados de Cannabis spp. realizadas por pessoas físicas e jurídicas, desde que devidamente autorizadas.

Acesso

O texto prevê, ainda, o acesso a produtos à base de cannabis e demais canabinoides às pessoas que necessitem, mediante prescrição válida de profissional legalmente habilitado pelo seu respectivo conselho de classe, para o tratamento de saúde de doenças, síndromes e transtornos. A obtenção pode se dar por meio de convênios com associações autorizadas ou a todo cidadão, em caráter de excepcionalidade, nas unidades de saúde públicas estaduais e entidades conveniadas de produtos à base de cannabis regulados pela Anvisa.

Também autoriza a aquisição pela Secretaria de Saúde de fitoterápicos à base de cannabis produzidos por entidades de cannabis terapêutica que estejam regulamentadas jurídica ou administrativamente e que possuam parcerias com centros de pesquisa para o controle de qualidade do produto.

Áreas de atuação: Saúde