O projeto de decreto legislativo nº 3/24, de autoria do deputado Renato Roseno, que propõe a convocação de plebiscito para que o povo cearense possa decidir sobre a reestatização da Companhia Energética do Ceará, atualmente sob controle privado da Enel, aguarda votação na Comissão de Constituição, Justiça e Redação da Assembleia Legislativa. A proposta está parada na CCJ desde maio do ano passado.
No fim do último mês de março, a Enel Ceará pediu a antecipação da renovação de sua concessão de distribuição de energia por mais 30 anos – mesmo com o contrato atual se encerrando apenas em 2028. A solicitação, protocolada junto à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e informada à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), reacendeu a polêmica em torno da péssima qualidade do serviço prestado pela empresa no estado.
O plebiscito é uma forma de exercício da soberania popular, assegurado na Constituição Federal no art. 14, I, e na Constituição Estadual no art. 50, II. Cabe a sua convocação nos casos em que se faça importante ouvir a população anteriormente à realização de ato legislativo ou administrativo, cabendo aos cidadãos, pelo voto, aprovar ou denegar o que tenha sido submetido à sua consulta.
“A soberania popular é princípio basilar do estado democrático de direito, que o ordenamento jurídico brasileiro buscou ampliar e consolidar através de plebiscitos, referendos e da iniciativa popular. Não tem sentido a legislação ter instrumentos tão democráticos e, em toda história do Ceará, a gente não ter realizado um plebiscito sequer para ouvir a população. Este pode ser o primeiro para ouvir sobre algo tão sensível a todos nós, que é o serviço de energia elétrica”, finaliza Roseno.
Segundo o parlamentar, é essencial debater formas de promover uma política energética mais próxima do interesse público. "A consulta plebiscitária à população cearense sobre a reincorporação da companhia ao patrimônio do Estado do Ceará por certo possibilitará a melhor orientação da política estadual para este serviço uma vez que os principais interessados na efetividade do serviço poderão tomar decidir de modo informado sobre a questão".
[+] Confira fala de Renato em plenário sobre o assunto
A privatização
A Companhia Energética do Ceará foi privatizada em 1998, durante o governo de Tasso Jereissati. À época, o argumento usado foi o de que a concessão melhoraria a qualidade do serviço. “Lá em 1998, a gente já dizia que onde privatizou, a qualidade caiu. Quero crer que, após tantos anos de acúmulos e queixas, tenhamos consciência do mal que fizemos com a concessão de serviços básicos para a sociedade. Precisamos de altivez e coragem para tomar a decisão que deve ser tomada. Escutar e obedecer a soberania popular”, defende Renato.
No nosso estado, a empresa Enel apresenta contrato desde 1998, com validade até maio de 2028. “Essa é a melhor oportunidade de discutir a concessão, já que estamos próximos do fim do contrato. O cearense poderá dizer se quer que ele seja renovado. Caso contrário, o Estado poderá se preparar para reassumir o serviço de energia elétrica”, avalia o parlamentar.
Desde 2020, a Enel lidera o ranking de reclamações no Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Decon) do Ministério Público Estadual, repetindo essa vergonhosa posição em 2021, 2022 e 2023. Paralelo a isso, a empresa, em 2023, obteve R$ 8,6 bilhões de receita líquida e R$ 315,47 milhões de lucro líquido.
Em setembro de 2020, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/CE) chegou a realizar pedido de auditoria à Agência Reguladora dos do Estado do Ceará (ARCE), em face de denúncias de cobranças de mais de uma fatura do serviço de fornecimento de energia elétrica. A recorrência das reclamações e a deterioração da qualidade do serviço prestado motivou a OAB/CE a iniciar estudos para avaliar a possibilidade de ingresso com pedido de perda da concessão da Enel para o serviço de fornecimento de energia elétrica.
“O modelo de privatização dos serviços essenciais está errado. Tanto é que em todo mundo, a começar pela Europa Central, está tendo um movimento de reestatização de serviços essenciais, como a água e energia elétrica”, defende Renato. (Texto e edição: Felipe Araújo / Foto: Marcelo Casal Jr-Agência Brasil)