Em sete anos, Ceará registrou quase mil mortes por intervenção policial

09/11/22 11:00

No Ceará, entre 2013 e 2020, foram registradas 950 mortes por intervenção policial. Até o dia 31 de outubro de 2022, registrou-se 35 mortes por intervenção policial no Estado. No Brasil, entre 2013 e 2021, foram mais de 43 mil mortes por intervenção policial, uma média de 13 por dia.

Os dados são do relatório do Comitê de Prevenção e Combate à Violência, publicação lançada nesta terça-feira (08/11), durante audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece) no auditório Murilo Aguiar. O debate faz parte da 5ª Semana Cada Vida Importa, realizada pelo Comitê.

O deputado Renato Roseno (Psol), presidente da Comissão, fez uma entrega simbólica do relatório à sociedade e órgãos do Judiciário, ressaltando a trajetória das famílias e entidades na busca por justiça e responsabilização e o silêncio do Estado frente às mortes causadas por intervenção policial.

Roseno citou pontos como conflitos de informações, inexistência de inquéritos, fragilidades legais, perda de prazos, morosidade ou omissão dos órgãos de controle ao comentar a falta de resposta às famílias e à sociedade.

Ao apresentar os demais dados do relatório, o parlamentar destacou que, no entanto, os números não refletem as vidas, passando a palavra para Edna Carla Sousa, que representou o coletivo Mães da Periferia.

Edna relembrou que 11 pessoas foram assassinadas pelo braço armado do Estado, pela Polícia Militar do Estado do Ceará, no que ficou conhecida como a Chacina do Curió, em novembro de 2015. Entre as pessoas assassinadas, seu filho. “Onze pessoas impedidas de viver”, afirmou.

Os jovens mortos nos diversos casos registrados no Ceará e que unem as famílias no grupo Mães da Periferia, comentou Edna, moravam nas periferias e favelas e lutavam para ter um futuro. “E não era o futuro de ir para um caixão”, disse. Cobrando justiça e respostas, ela compartilhou as dores e lutas contínuas enfrentadas pelas famílias.

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“Nós queremos nossa periferia viva, autoridades! Não dá mais para a gente chorar em cima dos túmulos dos nossos filhos, não dá mais para a única visita que você tem ser no túmulo do seu filho na esperança de que daquele túmulo saia um ‘oi, mãe’, mas não sai porque ele foi calado”, destacou Edna.

Representando o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE), a desembargadora Maria das Graças Almeida Quentalafirmou saber que as famílias saem frustradas pela falta de respostas de mais uma audiência.

Explicando o fluxo do Judiciário e a importância da mobilização da sociedade, a desembargadora se propôs ainda a receber as famílias das vítimas da violência estatal e fazer a mediação junto ao TJCE.

CAMPANHA PELO FIM DA VIOLÊNCIA ESTATAL

Alexandra Montgomery, diretora de Programas da Anistia Internacional do Brasil, afirmou que a audiência é emblemática na luta por justiça para as pessoas vitimadas pela violência do Estado e suas famílias.

Segundo ela, o levantamento feito pelo Comitê e lançado no suplemento especialé muito importante por colocar luz em uma atuação brutal e costumeira da polícia, com situações que mostram um padrão de violência e de impunidade.

A diretora de Programas da Anistia Internacional do Brasil comentou que a organização e diversas entidades, como o Cedeca, Fórum Popular de Segurança Pública e coletivos de famílias, construíram a campanha e o documentário “Descontrole – O Ministério Público no centro das atenções”, exibido na programação da 5ª Semana Cada Vida Importa.

Alexandra Montgomery explicou que a iniciativa tem como objetivo abrir um processo de diálogo com o Ministério Público de todo o País, pois a brutalidade policial precisa ser coibida com a participação de todos os atores sociais. O MP, complementou, precisa partilhar disso a partir de investigações eficientes e imparciais e apresentação dos processos ao Poder Judiciário.

Participaram da audiência Maria de Jesus, do Movimento Mães do Curió; Lila Salu, co-vereadora de Fortaleza; Márcia Lopes Pereira, representando a Procuradoria-Geral de Justiça do Estado do Ceará; Élder Ximenes, promotor de Justiça e coordenador do CaoCidadania, do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE).

Também estiveram presentes Mara Carneiro, coordenadora do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca); Lúcia Albuquerque, do Fórum de Segurança Pública; Lia Cordeiro Felismino, da Defensoria Pública do Ceará e Jacob Steverson, da Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário do Estado do Ceará (CGD).

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SEMANA CADA VIDA IMPORTA

A audiência compõe a 5º Semana Cada Vida Importa, a Semana Estadual de Prevenção aos Homicídios de Jovens do Ceará, instituída em 2017 em memória às vítimas da Chacina do Curió.

A programação segue até o dia 11 de novembro em Fortaleza e cidades do Interior e pode ser acompanhada no perfil do Comitê no Instagram. A Semana foi iniciada com exposição “Memórias e vivências”, no Anexo III da Alece. (Texto: Samaísa dos Anjos - Agência ALECE / Fotos: Antonio Rodrigues Junior)

Áreas de atuação: Direitos Humanos, Segurança pública