Água no Ceará: vai faltar para o povo e liberar para a carcinicultura e o agronegócio?

03/09/15 14:10

Sombra de uma pessoa sobre o chão rachado de um açude seco

Vai faltar água para o povo e liberar para a carcinicultura e o agronegócio? O deputado estadual Renato Roseno perguntou nesta quinta-feira (3) ao líder do Governo do Estado na Assembleia Legislativa, Evandro Leitão. "Essa decisão está pendendo sobre nossas cabeças", acrescentou o parlamentar do PSOL, dirigindo-se ao deputado do PDT. O questionamento foi durante pronunciamento em que Renato Roseno repercutiu a notícia sobre captação irregular de água pela carcinicultura no Baixo e Médio Jaguaribe.

O deputado do PSOL considera que há uma falta de controle do Governo do Ceará e uma ausência de planejamento da Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado em um cenário de estiagem tão severa. "Nossa obrigação legal, ética, é com o abastecimento humano". Ele aponta uma contradição pedir para a população economizar água, mas não ampliar a capacidade de controle sobre a utilização dos nossos recursos hídricos.

Dados da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Ceará (Cogerh) revelam que 72% das outorgas, concessões do Governo do Estado para uso de água, são para a indústria e a agricultura irrigada, enquanto apenas 12% são para o abastecimento humanos, em um cenário de escassez hídrica, com menos de 18% de água nos reservatórios. "Qual era a obrigação do Estado do Ceará, por intermédio da sua Secretaria dos Recursos Hídricos, dos seus agentes públicos? Gerenciar dentro de um cenário de escassez. O que diz a lei? A lei diz o óbvio: se o cenário é de escassez, é necessário priorizar o abastecimento humano", argumentou o parlamentar do PSOL.

Renato Roseno considera tardias a criação de uma força-tarefa para fiscalização dos criatórios de camarão no Baixo e Médio Jaguaribe e a suspensão de novas outorgas para a atividade na região, decisões tomadas nessa quarta-feira (2) pelo Conselho de Recursos Hídricos. "Veja a fragilidade do Governo do Estado: depois da denúncia, é feita uma força-tarefa para fiscalizar a captação irregular de água", questionou. "É uma comprovação de desídia permitir tamanho descaso com a água", afirmou, ao se referir à captação irregular por criatórios de camarão. "Portanto, eu fico espantado quando eu leio que agora é que se faz uma força-tarefa pra fiscalizar".

A carcinicultura é uma atividade de criação de camarão em viveiros que consome 2,5 vezes mais água doce do que uma plantação de arroz. "A criação de camarão em água salgada já é ambientalmente discutível no mundo inteiro. A criação de camarão em água doce, no Ceará, no semiárido, pode ser considerada praticamente um crime, pela quantidade de água necessária para esse tipo de atividade", asseverou o deputado do PSOL.

No entendimento de Renato Roseno, o Governo do Estado incorre em contradições ao tratar da questão dos recursos hídricos, "É absolutamente contraditória manter o calendário de fornecimento, por exemplo, da termelétrica ou da siderúrgica sem pensar reúso, alternativas, diminuição...". Ele lembrou que o governador esteve na Assembleia Legislativa no início do ano e falou de uma usina de reúso. "Nós estamos em setembro. Onde está esse investimento para o reúso da água?", indagou, alertando aos colegas deputados em plenário que o Ceará vai entrar em colapso, o que demanda decisões. "Não houve investimento em reúso de água, por exemplo. Houve uma peça de marketing: "diminua o consumo nas casas". Só que o consumo das casas, o abastecimento doméstico, é 12% da água do Ceará".

Outra contradição é manter incentivos para atividades que consomem grande quantidade de água. "Estou a denunciar a irresponsabilidade nesta gestão dos recursos hídricos. Essa Casa tem a sua responsabilidade, pois aprovou, na gestão anterior, com alguns votos contrários, 50% de desconto na tarifa da água bruta pra térmica do Pecém".

O deputado considera que é necessário melhorar a capacidade de controle do uso dos recursos hídricos; não fazer novas outorgas no Eixão das Águas e no Canal do Trabalhador; estimular atividades que utilizam menos água; investir em tecnologias para reaproveitamento do líquido; banir atividades econômicas e tecnologias de uso intensivo, como irrigação por inundação, já superada em várias partes do mundo; e combater a contaminação da água. "73% dos nossos açudes estão com a água comprometida", apontou.

Áreas de atuação: Fiscalização e controle, Meio ambiente, Recursos hídricos