Mandato em Itapipoca, por uma política energética sustentável, democrática e socialmente justa

23/10/15 16:00

Indígenas e outras pessoas em roda e ao fundo, na Câmara Municipal de Itapipoca, antes da audiência pública

"Esses grandes parques eólicos são para atender ao capital internacional, que tem de ruma no Ceará. Eles não querem saber da mãe terra, do povo, da gente, só querem saber de lucrar com energia", afirma Antônio Sousa, agricultor e morador do assentamento Maceió, em Itapipoca. Ele foi um dos participantes da audiência pública realizada no município, nesta sexta-feira, 23 de outubro, para discutir as contradições na implantação de parques eólicos no Estado. A audiência pública foi proposta pelo deputado estadual Renato Roseno (PSOL).

A energia eólica, que é a transformação da energia do vento em energia útil, inclusive para gerar eletricidade por meio dos aerogeradores, emite pouco dióxido de carbono, produz muita energia, não gera produtos secundários radioativos ou radiação ionizante, o que tem criado uma imagem de energia limpa e sustentável. No entanto, no Brasil, ao contrário do que acontece em países europeus, as eólicas são usadas de maneira complementar e não alternativa. Aqui, ao mesmo tempo em que as eólicas crescem, expande-se também o uso da energia fóssil e do setor nuclear, uma enorme contradição que tenta ser justificada pela premissa da “diversificação da matriz energética”.

Não somos contra as energias renováveis, mas somos a favor de uma nova política energética baseada em sustentabilidade, democracia e justiça socioambiental. Somos contra a expulsão das comunidades de suas áreas para dar lugar aos parques eólicos, somos contra a degradação ambiental que esses empreendimentos causam, somos contra a vários outros problemas sociais decorrentes.

O mandato esteve na "Cidade dos três climas" para ouvir instituições e movimentos, o que possibilitou uma boa escuta acerca dos impactos das eólicas, impactos possíveis e reais. Nas falas e nas faixas, a tradução de um sentimento contrário à implantação dos aerogeradores, porque representam para muitas comunidades a destruição da cultura, de um modo de ser e de estar no território: "A população de Itapipoca defende a vida e diz não a eólica". "Não queremos a eólica! Diga "sim" à vida e "não" à eólica". "Parques eólicos. Não toleramos destruição. Queremos esse malefício longe do nosso chão". "Eólica, queremos você fora daqui. Em nossa terra você não fica, porque destrói a natureza, que a gente tanto necessita".

Comunidades de Itapipoca temem pelos impactos sociais e ambientais já enfrentados em outras localidades, como nos municípios de Aracati e Acaraú, também na zona costeira do Estado. Os parques eólicos podem afetar direta e negativamente as atividades produtivas e o modo de vida das comunidades do entorno. Pensar um modelo energético sustentável, democrático e justo é urgente no contexto atual, em razão das mudanças climáticas. Os grandes parques eólicos apresentam inúmeras contradições e diversos problemas, como a privatização da terra e da água, a perda do território das comunidades tradicionais, o impacto na paisagem, a poluição sonora e o aumento da violência contra a mulher e da exploração sexual de crianças e adolescentes, problema esse relacionado à presença massiva de operários no período de implantação.

Mesmo convidados para a audiência pública, não estiveram presentes órgãos governamentais, como a Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema) e a Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace). O convite para contribuir com a discussão sobre os parques eólicos no Ceará foi extensivo ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itapipoca, Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Escola do Campo Nazaré Flor, Associação dos Cultivadores de Algas de Maceió (Acalma), Associação Comunitária do Imóvel Maceió (Ascima), Colônia de Pescadores, Prefeitura de Itapipoca, Povo Tremembé de Itarema e Itapipoca, Associação do Desenvolvimento Comunitário de Flecheiras, Conselho Pastoral dos Pescadores, Movimento de Pescadoras e Pescadores do Ceará, Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Sem Teto, Instituto Terramar, além do professor Jeovah Meireles, do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará, do Programa Residência Agrária - projeto de extensão da Universidade Federal do Ceará, e do Núcleo de Educação Ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.

Áreas de atuação: Direitos Humanos, Adolescência, Indígenas, Meio ambiente, Raça e etnia, Recursos hídricos